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Hoje é dia: 10/10/2025



Trevor Jones e a música do filme "O Último dos Moicanos" 

Por Luigi Rotelli

Uma vez assisti a um documentário mostrando a importância do som e da trilha sonora no cinema. Eles colocaram algumas das mais famosas cenas de suspense de Alfred Hitchcock com e sem a música. A diferença era tão grande que a falta da música anulava a cena e mesmo o mais genuíno suspense já produzido em todos os tempos se tornava risível.

O cinema sem uma boa música é uma obra desnatural. A trilha sonora e os efeitos de som que se misturam à música são a alma do cinema. O filme pode até ser mudo, mas não sem uma trilha sonora.

Trevor Jones entendeu isso desde cedo. Ele nasceu na Cidade do Cabo, Africa do Sul, em 1949 e morava defronte a um velho cinema que frequentemente tinha problemas com o som, que falhava durante a exibição. O compositor de trilhas sonoras fortes e incrivelmente expressivas como a do filme “O Último dos Moicanos” e em “Em Nome do Pai” talvez tenha surgido nesse contexto.

Ouça abaixo a música do filme “O Último dos Moicanos” (The Last of the Mohicans), dirigido por Michael Mann em 1992. É de uma força e de uma beleza extraordinária, como a dos personagens do filme, especialmente Daniel Day-Lewis, que passou 6 meses na selva, caçando e pescando antes da filmagem para incorporar o personagem que vive no filme junto com Russel Means, seu pai índio, o irmão Eric Schweig e a bela Madeleine Stowe, que tem um papel forte e expressivo.

A música chama-se Promentory. Ela marca uma longa cena de mais de 8 minutos – do momento em que eles escapam da aldeia Huron ao momento que Chingachgook mata Magua. É a variação de uma dança irlandesa em um apaixonante movimento contínuo, enquanto a orquestra desenvolve ao fundo o dramático tema principal do filme.

  

 

Embora o resultado tenha sido extraordinário (eu realmente gosto desse filme) a produção, dizem, foi bastante conturbada, verba e prazo estourados e o estúdio pressionando contra o perfeccionismo de Michael Mann. E Mann, que tinha encomendado a Jones uma trilha sonora com música eletrônica, resolveu mudar de última hora (ainda bem!) para música orquestral.

Com os constantes cortes e montagens da edição, Jones teve que reescrever a música várias vezes para adequá-la ao timing do filme. Com tudo isso, já havia produzido mais de 50 minutos de boa música mas não conseguiu atender a todas as mudanças de último minuto e, com a data de lançamento iminente, Randy Edelman foi chamado para completar a trilha sonora em cenas menores e recebeu a co-autoria nos créditos. Por essa desastrada razão uma das mais incríveis músicas de cinema tornou-se inelegível para concorrer ao Oscar.

Eu tenho o CD dessa inesquecível trilha sonora que sem dúvida era merecedora do Oscar. Da faixa 1 a 9 é Trevor Jones e da 10 a 15 é Randy Edelman. Mas nem precisava dessa informação na contracapa, pois a diferença entre elas é nítida. A música de Trevor Jones é de uma força e um impacto tão grande que em contraste deixa a de Edelman a ver paisagens.

No vídeo abaixo, o próprio Trevor Jones conduzindo o tema do Último dos Moicanos com a RTVE Symphony Orchestra na Espanha em 2006. Na sequência, Main Theme, The Kiss, Fort Battle e Top of the World, todas lindíssimas. Como eu gostaria de ver uma apresentação dessas ao vivo… O som da gravação não está muito bom, mas dá para sentir o impacto do espetáculo. Eu acho uma das músicas mais impressionantes do cinema. Repare a segunda música, The Kiss: é a dança gaélica em violino solo em moto-perpétuo. E o som é parecido com o de uma gaita de foles. O tema principal do filme é dramaticamente desenvolvido pela orquestra em segundo plano e acaba se sobrepondo à dança, que no final é retomada pelo violino. É um espelho do que acontece no filme, em meio ao drama da guerra. (…e quem será essa violinista linda que aparece ao lado do solista?)

 

 

Mais para frente vou preparar um segundo artigo sobre Trevor Jones com as trilhas sonoras do delicioso filme Notting Hill entre outros.

Luigi Rotelli (Entre Culturas)


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